Dois Cantos

27.1.06

As doze badaladas

É, fada madrinha. A meia noite chegou cedo pra mim. E justo eu, que não vivo sem relógio, dessa vez não olhei as horas e não percebi. Minha roupa virou farrapos bem na hora em que eu ia entrar no salão e as rodas de conversa simplesmente ignoraram minha maltrapilha existência.
E sabe, fada madrinha, enquanto eu me arrumava e você me ajudava, eu tinha certeza que tudo daria certo. Não tinha por que dar errado. Estava tudo tão caprichado, eu sabia exatamente como me comportar, o que falar, até mesmo como sorrir. Você tinha dado um jeito nos meus ímpetos respondões e eu me sentia preparada pra tudo. Eu ia ganhar o mundo.
Mas aí eu entrei no salão e notei que todos em coro me ignoravam. Deixaram que eu ficasse vagando, perdida, entre cadeiras e pilares, encantada com tudo, sonhando que, por estar lá, talvez pudesse ser um deles.
E assim eu fui Cinderela. Durante todo o caminho até chegar ao salão. Só. E, como quando eu cheguei minhas roupas já eram farrapos, não tive nem a chance de deixar um sapatinho de cristal para alguém me seguir e me resgatar.


27 de janeiro (1756)
- Nasce em Salzburg, na Áustria, o músico Wolfgang Amadeus Mozart. Aliás, este ano é o ano de Mozart.

26.1.06

Meu cachorro

24.1.06

Todo dia

Todo dia tem o porteiro dando bom dia. Todo dia tem o senhor na frente do mercadinho da rua de baixo parado na porta, de óculos, de pé, olhando as pessoas que passam na rua. Todo dia tem as meninas da recepção sorrindo, e as pessoas com cara de sono, e a moça limpando a máquina de café. Tem a hora do almoço e a mulher simpática da padaria que me chama pelo nome. Tem a menina na janela do primeiro andar que grita um oi pra mim quando eu entro no prédio.
Todo dia tem café e mais café à tarde, e tem o apartamento estranho no último andar do prédio da frente do trabalho. Tem o fone de ouvido e alguma banda bacana. Todo dia tem um texto pra fazer que chega de última hora, e um outro pra revisar o mais rápido possível. Tem uma idéia estranha e outra que demora pra chegar. Tem a hora da fome e a procura incessante pela caneta azul com uma etiqueta com o meu nome. Todo dia tem a sirene da empresa ao lado tocando às 18h. Todo dia tem o caminho de volta pra casa e o senhor com a cachorrinha de lacinho passeando na entrada do prédio. Tem a criança brincando na sacada do primeiro andar do prédio da frente e o cachorro gordo andando, grudado na grade da cobertura do mesmo prédio da frente. Tem as TVs ligadas e algumas mulheres na esquina. Todo dia tem umas páginas de um livro. Todo dia tem meu travesseiro. Todo dia tem meus sonhos.


24 de janeiro
- dia da previdência social
- dia da constituição

23.1.06

25

Eles chegaram. Antes que eu imaginava. E sem que eu me desse conta, instalou-se em mim um sentimento contraditório em relação a minha idade. Em cinco anos estarei nos 30. Nunca antes me vi com 30 anos. Nem me vejo agora!
É engraçado isso, essa sensação de que se é velho pra algumas coisas e ainda muito novo pra outras tantas. A última vez que senti isso foi quando eu tinha uns 12 anos, acho. Eu ainda tinha vontade de brincar, mas, sem saber o porquê, às vezes aquilo parecia meio ridículo.
Será que quando eu estiver mais velho e meus filhos já forem grandes vai acontecer a mesma coisa? A mesma sensação? Acho que sim. Vejo meus pais, por exemplo. Eles babam por uma criança. Minha mãe às vezes até fala de um neto. Mas ao mesmo tempo, nenhum deles “está pronto” para ser avô.
Como é difícil passar pelas “etapas” da vida! E é engraçado como a transição dessas etapas é marcada socialmente. A gente é cobrado por isso. Quando você termina o colegial, tem que entrar na faculdade. As perguntas sobre namorado/a que vinham sendo feitas desde os 15 ou 16 anos, mais ou menos, dão lugar à curiosidade sobre sua vida profissional, todo o seu potencial e as previsões sobre o seu brilhante futuro. “Qual faculdade você vai fazer?” - essa é a perguntar-base para qualquer conversa com alguém com seus 18 anos. E tem gente que não sabe nem mesmo continuar o assunto se o fulano nos seus 18 anos não estiver pensando em faculdade. Depois de resolvida a situação da faculdade, satisfeitos todos os desejos de todo mundo sobre o seu futuro, as perguntas sobre namorado voltam. Para as meninas é assim. Para os meninos, nem sempre. Claro que todo mundo fala da curtição da faculdade, mas no fundo, no fundo, ninguém tá mesmo afim de ouvir as loucuras do mundo universitário. Ninguém quer ver que o tempo passou pra si mesmo e que agora não tem mais a chance de fazer as loucuras que o cara da faculdade faz. Então volta o assunto namorado/a. Depois de algum tempo que você está namorando e, obviamente, já acabou a faculdade, começam as perguntas sobre casamento. É, porque ninguém é louco de tocar nesse assunto enquanto você ainda está na faculdade. Principalmente com os meninos, porque eles, sim, devem aproveitar a vida (como se aproveitar a vida se resumisse em baladas e orgias de solteiros, e como se fosse verdade que essas orgias deixam de habitar o imaginário masculino mais velho para se realizar no incrível período universitário!). De qualquer forma, as perguntas sobre casamento chegam para todos. É inevitável. E depois das perguntas sobre casamento, ou até mesmo junto com elas, vêm as perguntas sobre filhos. Porque parece que ninguém consegue conceber a idéia de que um casal pode ser feliz sem um filho. E aí as perguntas sobre você dão uma trégua e entram as perguntas sobre o seu filho. Ele já está andando? Já está falando? Sabe ler? Você deixa ele ir no clube sozinho? E assim é a vida. Uma sucessiva bateria de pergunta e respostas.
É, meus 25 chegaram. Estou perto dos 30 tanto quanto estou perto dos 20. Ando respondendo as perguntas que me fazem com um sorriso. Isso é o suficiente que as pessoas precisam saber de mim, da minha vida. Meus desejos, meus sonhos e minhas angustias são meio confusos dentro de mim, como foram antes, como vão continuar sendo e como, aposto, são pra todo mundo. E, na verdade, eu gosto disso. Eu gosto do frio na barriga que me dá antes de conhecer coisas novas, eu gosto da improvisação, eu gosto de ter opções nas mãos e poder escolher, mesmo que tudo isso me custo alguns tropeços. Eu gosto dos meus 25 anos.


22 de janeiro
- aniversário do Kiko (25 anos)

17.1.06

Meu mundo

Sou apaixonada pelo mundo. Sempre fui.
Acho o máximo saber que enquanto eu vejo o sol, milhares de outras pessoas vêem a lua. Amo tantas línguas e tantos jeitos diferentes de falar qualquer coisa. E os lugares todos desse mundo? Lugares que o homem ainda nem viu. Lugares que todo mundo vê e que, quando você está lá, se sente num filme. Lugares que o homem construiu e outros que ele nem imagina como foram feitos. Adoro as histórias contidas em cada pedacinho deste planeta, mesmo sem conhecer nenhuma delas. O silêncio e o barulho de cada cenário. Os personagens anônimos que compõem cada quadro da vida no mundo.
Quero passar por todos esses lugares. Com chuva ou com sol. Falando ou fazendo mímica pra tentar me fazer entender. Quero gritar do alto da Torre Eiffel, sussurrar dentro de algum castelo medieval, chorar de emoção em Machu Pichu, arregalar os olhos diante das pirâmides, beijar o Kiko numa gôndola em Veneza. Eu quero fazer guerrinha de bola de neve em algum ligar frio. Eu quero comer uma coisa que eu nem sei o que é, mas é a comida típica de algum lugar. Eu quero ligar pra minha mãe e dizer “mãe, você nem imagina onde eu estou”. Eu quero ver os Moais da Ilha de Páscoa e as tulipas da Holanda. Correr pelas praças da Itália. Chegar um pouco mais perto de Deus na Basílica de São Pedro e ser mais pagã em Stonehenge. Tocar a muralha da China. Abrir os braços sob o Cristo Redentor. Ficar maravilhada com o Taj Mahal. Mergulhar no Pacífico em alguma praia do Japão. Aprender a surfar na Austrália.
Eu quero asas, que já tenho em minha mente. Porque eu tenho certeza que tudo isso me espera. Porque eu sei que preciso fazer tudo isso. Porque eu sou do mundo, e o mundo é meu.


17 de janeiro (1929)
- O marinheiro Popeye aparece pela primeira vez em tiras de quadrinhos. O personagem era criação de E.C. Segar.

16.1.06

Eis no que acredito

"Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa: “Navegar é preciso; viver não é preciso.”
Quero para mim o espírito desta frase, transformada a forma para a casar com o que sou: Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
Não conto gozar a minha vida; nem gozá-la penso. Só quero torná-la grande, ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a minha alma a lenha desse fogo.
Só quero torná-la de toda a humanidade; ainda que para isso tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso. Cada vez mais ponho na essência anímica do meu sangue o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir para a evolução da humanidade.
É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça."


Fernando Pessoa
16 de janeiro (1957)
- Inaugurada a casa noturna The Cavern Club, em Liverpool, na Inglaterra. Foi neste pub que os Beatles iniciaram sua carreira artística.

13.1.06

Na padaria

- Moça, quanto custa esse pão doce?
- 52 centavos
- Hum... eu tenho 50 só. Você não deixa ele por 50 pra mim? Eu sempre compro aqui, estudo aqui do lado.
- Não posso. É 52. vai levar?
- Ah, não, obrigada! E esse outro pãozinho? Quanto custa?
- Esse é 48 centavos.
- Então eu quero esse. Olha a moeda.
- Ah... o troco pode ser bala?

(O pior é que isso realmente aconteceu comigo quando eu fazia cursinho!)


13 de janeiro (1989)
- O Sexta-Feira 13, primeiro vírus mundial, inicia seu ataque em computadores na Inglaterra.

9.1.06

Coisa de criança

Coisa de criança é brincar. É ter os olhos brilhando por ver bexigas coloridas ou encontrar pessoas queridas. Coisa de criança é ver graça em coisas simples e dar risada quando as coisas não saem como o esperado. É cair, dar uma olhadinha em volta, levantar e continuar a andar. Coisa de criança é contar estrela numa noite bonita e aproveitar todos os minutos de um dia de sol, mesmo que seja no quintal de casa.
Coisa de criança é ver nas outras crianças incríveis possibilidades de amizade, sem hierarquia e sem que qualquer diferença seja um empecilho. É ser sincero ao correr pros braços que são seu porto-seguro, sem que isso seja um sinal de fraqueza, mas um delicioso gesto de confiança. É não se envergonhar de não saber tudo e estar sempre pronto para aprender. É ter a curiosidade ativada sempre, para tudo, porque tudo é interessante sob algum ponto de vista.
Coisa de criança é colocar uma roupa confortável e se deliciar com um sorvete. É andar descalço e sentar no chão. É chupar o caroço da manga até ficar todo lambuzado e se divertir com isso.
Coisa de criança é simples. Coisa de adulto é que não dá pra entender.


9 de janeiro
- dia do fico
- dia do astronauta

6.1.06

Ano Novo

Ano novo, vida nova! Que bordão!
Mas a verdade é que nada é mais renovador para nosso espírito, nossa vontade de mudança e até mesmo para nossos regimes que o ano novo. Nenhuma segunda-feira no ano é tão inspiradora para começarmos a fazer qualquer coisa do que um começo de ano.
É social! O champanhe que empurra a rolha e se espalha pela garrafa lava todas as desilusões do ano que acabou, as promessas não cumpridas, os erros, os desentendimentos e inaugura a nova chance de fazermos tudo de novo, ou tudo diferente.
É impossível ficar indiferente a tudo isso. E eu nem quero! Minha lista de proposições para este ano está feita (desde o dia 31 de dezembro) e muitas coisas dela já estão em prática.
Bom ano pra todo mundo que acompanha o Dois Cantos. Espero não decepcionar ninguém este ano, nem ter que trocar de endereço novamente!


6 de janeiro
- dia de reis
- dia da gratidão